Nada de risos e deboches
Ia esperar o mês de maio findar para escrever sobre o que vi e li a respeito dos 130 anos de nascimento de Lima Barreto, entretanto creio sofrer de um mal que me impede de ficar calado, é preciso cultivar a paciência, bem sei disso, porém perder as estribeiras por vezes muito nos serve, sobretudo na literatura. São 130 anos do nascimento do rebelde de Todos os Santos, o mulato que rasgava as noites cariocas, um notívago por excelência, do suburbano de letra incisiva que sacudia a República, do intelectual que viveu da abolição da escravatura à semana de arte moderna (e nunca fora considerado moderno, inventaram o tal de pré-moderno, notem que não falo de escolas). Os contemporâneos de Afonso Henriques de Lima Barreto, bem como de nossa geração, ainda estão longe de entendê-lo e lhe dar o devido lugar de destaque na Literatura. Peço a devida permissão ao professor L.R. Leitão para fazer uso aqui da expressão “Rebelde Imprescindível” como forma de definir este singular homem, é isso mesmo, rebelde, palavra melhor não o define. Mas vamos ao fato que está me motivando a escrever hoje sobre Lima Barreto. Li hoje um artigo, que deveria ser uma homenagem a Lima B., publicado online no Observatório da Imprensa, com o seguinte título “Riso, deboche e literatura, 130 anos do genial Lima Barreto”. E fico a me perguntar onde é que a ilustre colega jornalista ( perdoe-me não sou jornalista) Cristina Nunes de Sant´Anna vê Lima Barreto com riso? Sua literatura não é simpática, ela é crítica sem ser velada como a de Machado de Assis, e a Sra. Sant´Anna bem pontua isso em seu artigo, mas não entendo por qual motivo crer que nosso notívago de Todos os Santos ria, será da própria miséria ou da alheia? Deboche também não é bom sinônimo para a escrita de Lima B. cara colega (perdão novamente pelo uso indevido do substantivo), a Literatura de Lima Barreto não fazia gozação, isso é rebaixar sua escrita a uma mera discussão de botequim, alguém que faz piada da desgraça sofrida e que nem percebe o quão miserável é, e fica a fazer troça do governo. Nenhum jornal rendera uma homenagem digna ao nosso rebelde, o artigo da Sra. Sant´Anna se prezou a isso, mas não obteve êxito, falou dos momentos históricos pelos quais a curta vida de Lima Barreto passou e num segundo momento com um subtítulo de “firme e malcriada” cometeu o absurdo de insinuar a Literatura de Lima como malcriada, assim parece até que a autora está contra o mulato suburbano das letras, a mim o termo soou mais como uma repreensão ao escritor. Creio que a Sra. Sant´Anna desconhece que Lima foi antes de mais nada um homem que lutou a vida toda, por isso imprescindível, como diria Brecht, citado pelo professor L.R. Leitão no seu livro “Lima Barreto, o rebelde imprescindível”. Sendo assim este mulato não era malcriado, a República que era grosseira com a periferia. Faltou paixão da Sra. Sant´Anna para falar do nosso “bêbado e esbodegado” (infeliz expressão da senhora Cristina Sant´Anna). Não me alongarei mais, corro sério risco de usar de “infelizes expressões” no artigo da Sra. Sant´Anna. Não era de se esperar que um jornal focado na crítica da mídia publicasse artigo à moda Imprensa Brasileira. 130 anos e o que a mídia publica de melhor em homenagem a Lima Barreto é um artigo de riso, debochado e de literário nada.
Ilha do Governador, 28-05-2011